CUSCO
PERU

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Procissão do Senhor dos Terramotos
Segunda-feira depois da Sexta-Feira Santa
A celebração do Senhor dos Terramotos (Señor de los Temblores) é uma das festas religiosas mais importantes da cidade de Cusco e representa uma fusão singular entre o catolicismo introduzido pelos espanhóis e as crenças ancestrais dos Andes. A imagem é considerada o padroeiro jurado da cidade, e a sua procissão é o ponto alto da Semana Santa em Cusco. Todos os anos, na Segunda-feira Santa, milhares de fiéis saem às ruas para acompanhar a imagem do Cristo Crucificado, num acto colectivo de fé, memória e identidade regional. A origem da devoção remonta ao século XVII. Em 1650, Cusco foi atingida por um violento terramoto que causou grandes estragos na cidade. Segundo a tradição, durante o sismo, os habitantes retiraram da catedral uma imagem de Cristo crucificado, que, ao ser levada em procissão pelas ruas, fez com que os tremores cessassem. Desde então, essa imagem passou a ser venerada como o Senhor dos Terramotos, protector da cidade e intercessor contra catástrofes naturais. A imagem, de grande valor simbólico, é também conhecida pela sua cor escura, resultado de séculos de exposição à fuligem das velas e do incenso, bem como ao fumo das fogueiras acesas pelos fiéis. Dias antes da procissão, a imagem é cuidadosamente decorada com flores vermelhas, sendo o ñucchu, uma flor tradicional andina, a mais usada. Esta flor tem um significado profundo, pois era oferecida aos deuses incas nos tempos pré-hispânicos, simbolizando sacrifício e protecção. Na Segunda-feira Santa, milhares de pessoas reúnem-se desde cedo no centro histórico de Cusco. A catedral permanece aberta ao longo do dia, com missas contínuas. Ao final da tarde, inicia-se a procissão do Senhor dos Terramotos, que percorre as ruas principais da cidade, passando pela Plaza de Armas, onde o arcebispo dá a bênção solene à cidade. Durante a procissão, os sinos da catedral tocam de forma pausada e os fiéis lançam pétalas de flores sobre a imagem.

Festa das Cruzes
3 de Maio
Se há altura do ano em que Cusco vibra de forma diferente, é no início de Maio. As ruas enchem-se de música, as colinas brilham com cruzes ornamentadas, e a cidade inteira parece respirar ao ritmo da devoção popular. As Festas das Cruzes, conhecidas localmente como Cruz Velacuy, não são apenas uma celebração religiosa — são um espetáculo de identidade, memória e orgulho andino. Tudo começa dias antes do 3 de Maio, quando cada bairro prepara a sua cruz. Mas não são cruzes comuns: são verdadeiras obras de arte popular, cobertas de tecidos bordados, flores frescas, espelhos, fitas e tudo o que cada comunidade tem de mais bonito. Cada cruz tem a sua história, o seu percurso, e, acima de tudo, o seu povo. Na véspera, ao cair da noite, acontece velação da cruz. À luz de velas, famílias inteiras reúnem-se à volta das cruzes. Rezam, cantam, tocam instrumentos tradicionais, partilham comida, dançam. É fé, sim — mas também festa, amizade, calor humano. Tudo é vivido com intensidade, e o ambiente mistura o sagrado com o festivo de forma natural e arrebatadora. O dia 3 começa cedo, com missas solenes nas principais igrejas da cidade. Depois, as cruzes saem à rua, transportadas em andores imponentes, entre músicas e danças que transformam o centro histórico de Cusco num palco a céu aberto. Desfilam figuras com trajes tradicionais: guerreiros com penas e lanças, homens com fardas coloridas que evocam os tempos coloniais, e grupos de músicos andinos que tocam flautas de pã, bombos e tambores. Ao longo do dia, há refeições colectivas, feiras nas praças, música ao vivo e encontros entre vizinhos, amigos e familiares que regressam propositadamente a Cusco para a celebração. O ambiente é contagiante — mesmo quem chega de fora sente-se parte de algo especial. E o que torna esta festa tão única? O facto de não ser feita para os turistas. Não há encenações nem filtros: tudo é verdadeiro, nascido da tradição e mantido com orgulho.

Festival da Construção da Ponte de Q’eswachaka
Segundo fim-de-semana de Junho
No meio das montanhas da região de Cusco, há um lugar onde o tempo parece parar durante quatro dias. Aqui, sobre o rio Apurímac, um grupo de comunidades andinas junta-se todos os anos para reconstruir, com as próprias mãos, uma ponte suspensa feita apenas de fibras vegetais. O nome deste lugar é Q’eswachaka, e o seu festival é uma das tradições mais fascinantes e autênticas de todo o Peru. Não se trata de uma recriação histórica para turistas. A ponte de Q’eswachaka é real, funcional, usada por quem vive nas redondezas, e reconstruída anualmente da mesma forma há mais de cinco séculos. Este ritual colectivo foi reconhecido como Património Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO, e é muito mais do que um simples trabalho comunitário: é um acto de identidade, respeito pela natureza e continuidade cultural. A preparação começa semanas antes, quando as mulheres das quatro comunidades envolvidas (Huinchiri, Chaupibanda, Choccayhua e Ccollana Quehue) recolhem e preparam a ichu, uma erva resistente que cresce nas zonas altas dos Andes. Esta fibra é torcida à mão até formar grossos cabos que, depois, serão entrelaçados — de forma absolutamente precisa — para suportar a estrutura da ponte. O processo é 100% manual, sem um único prego, corda industrial ou ferramenta moderna. Durante os quatro dias do festival, cada comunidade tem a sua função. Os homens mais experientes trabalham em equipa nas margens do desfiladeiro, lançando os cabos e ajustando os nós. Tudo é feito com base na memória colectiva, passada de geração em geração. Há música tradicional, cantos rituais e momentos de celebração em paralelo com o trabalho físico. No final, quando a ponte fica pronta, celebra-se com danças e comida partilhada: é a prova de que, mais uma vez, a tradição sobreviveu. O momento mais emocionante é atravessar a ponte acabada de construir. Estreita, oscilante e com mais de 28 metros de comprimento, a travessia não é apenas física — é simbólica. É como atravessar a história viva de um povo que nunca se desligou das suas raízes. Ao contrário de muitas festas andinas, o Festival de Q’eswachaka não tem pompa nem aparato turístico. Quem lá vai é convidado a assistir com respeito, a aprender em silêncio e, se tiver sorte, a ser incluído num almoço comunitário improvisado. O ambiente é simples, mas profundamente autêntico.

Inti Raymi - A Festa do Sol
24 de Junho
Todos os anos, por um dia, Cusco volta a ser capital de um império, o Qosqo sagrado, onde centenas de figurantes, músicos e dançarinos recriam com rigor um dos rituais mais importantes da história andina. Originalmente celebrado no solstício de Inverno, o Inti Raymi marcava o momento em que o sol, divindade suprema para os Inca, começava o seu regresso ao céu. Era uma cerimónia para pedir boas colheitas, agradecer à natureza e reforçar os laços entre o povo e o cosmos. Com a chegada dos espanhóis, a festa foi proibida, mas nunca esquecida. Hoje, é uma recriação histórica profundamente respeitada, que mobiliza toda a cidade e atrai quem procura conhecer o verdadeiro coração da cultura andina. O dia começa no Qorikancha, o antigo templo do sol, onde o Sapa Inca — figura central da cerimónia — saúda os primeiros raios da manhã com palavras em quéchua. Daqui, o cortejo imperial segue pelas ruas até à Praça de Armas, onde se realiza a segunda parte da cerimónia. Há oferendas simbólicas, música ao vivo, danças cerimoniais e personagens que representam os quatro cantos do antigo império: o Antisuyu, Chinchaysuyu, Qollasuyu e Cuntisuyu. A parte mais imponente da celebração acontece em Sacsayhuamán, a impressionante fortaleza nos arredores de Cusco. É aqui que o Inca realiza o ritual principal: oferece folhas de coca, chicha e lama às divindades da terra e do céu, invoca os espíritos da natureza e simbolicamente agradece ao sol pela vida. O Inti Raymi não é um desfile nem um festival comercial. É uma celebração feita com seriedade, com trajes desenhados a partir de crónicas coloniais, com música tocada ao vivo por músicos locais e com falas em língua quéchua. Tudo é pensado para preservar a dignidade do ritual e a verdade histórica por detrás do espectáculo.

Ano Novo Andino
21 de Junho
Na madrugada de 21 de Junho, enquanto o céu começa a clarear sobre as montanhas, centenas de pessoas erguem os braços em direcção ao horizonte. Várias comunidades espalhadas pelos Andes, repetem o mesmo gesto: saudar o primeiro raio de sol do novo ciclo. É o Ano Novo Andino, o início de uma nova etapa na vida da terra e do povo que a habita. Celebrado no solstício de Inverno, este momento assinala o regresso simbólico do sol, depois da noite mais longa do ano. Para as culturas andinas, é um ponto de viragem. Marca o fim de um ciclo agrícola e o começo de outro. É tempo de agradecer à Pachamama (a Mãe Terra), pedir protecção, fazer limpezas rituais e renovar compromissos com a comunidade e com o mundo natural. Ao contrário do que acontece no calendário ocidental, aqui o novo ano não se mede por relógios ou fogos de artifício. Mede-se pela luz. Quando o sol reaparece, depois de dias cada vez mais curtos, começa um novo tempo. E esta passagem é vivida com intensidade, respeito e um profundo sentido espiritual. A celebração mais conhecida ocorre em Tiwanaku, na Bolívia, um antigo centro cerimonial onde os raios do sol atravessam, com precisão milimétrica, os portais de pedra construídos há mais de mil anos. Mas em Cusco e noutras partes do Peru, o ritual repete-se com a mesma emoção: há oferendas à terra, cerimónias com folhas de coca, fogueiras, música tradicional e orações em quéchua. Em algumas comunidades, as pessoas vestem-se com roupas tradicionais e passam a noite a preparar-se para o nascer do dia, num ambiente de recolhimento, mas também de partilha. O Ano Novo Andino é discreto, mas profundamente simbólico. Não há multidões nem espectáculos encenados. Há silêncio, canto, frio e luz. Há mãos que se unem, olhos fechados, passos sobre a terra gelada. E há um sentimento que se partilha entre todos: o de que a vida, apesar de tudo, recomeça. Para quem procura conhecer o lado mais íntimo e autêntico dos Andes, esta é uma experiência imperdível. Não como espectador, mas como participante silencioso de um momento ancestral, que continua a acontecer, ano após ano, com a mesma força de sempre.

Warachikuy
Terceiro domingo de Setembro
Celebrado todos os anos, em Setembro, o Warachikuy recria um antigo ritual militar e educativo do Império Inca. Antigamente, os jovens do império — especialmente os filhos da nobreza — eram preparados durante anos nas escolas do Yachaywasi (a “casa do saber”). Ao atingir a idade exigida, tinham de demonstrar que estavam prontos para assumir responsabilidades na sociedade. E essa prontidão era testada de forma prática, através de provas exigentes: correr longas distâncias, atravessar cordas suspensas, lutar corpo a corpo, suportar o frio, o medo e o cansaço sem desistir. Hoje, o espírito do ritual mantém-se. O Warachikuy moderno é organizado em Cusco como uma cerimónia cultural e educativa, onde estudantes do ensino secundário — muitos deles descendentes de famílias quechuas — enfrentam provas inspiradas nas antigas tradições inca. As provas incluem corridas, escalada, saltos, desafios de equilíbrio e força, entre outros. Cada etapa representa uma qualidade que o jovem deve demonstrar: coragem, disciplina, inteligência, controlo do corpo e respeito pela tradição. No final, os participantes recebem a “wara”, uma espécie de tanga cerimonial que, em tempos, simbolizava a entrada oficial na vida adulta masculina inca. Mas o Warachikuy é mais do que um conjunto de provas. É um espectáculo vibrante, com trajes tradicionais, música ao vivo, danças cerimoniais e uma encenação cuidada que envolve professores, alunos, músicos e membros da comunidade. Embora tenha sido interrompido após a chegada dos espanhóis, o ritual foi recuperado no século XX como uma forma de revitalizar o património cultural andino. Hoje, é reconhecido como parte importante da identidade de Cusco e como um evento educativo com enorme valor simbólico. Se estiveres em Cusco em Setembro, não percas a oportunidade de subir a Sacsayhuamán e assistir ao Warachikuy. Não é um espectáculo feito para impressionar — é uma tradição com raízes profundas, onde se sente de forma clara o orgulho de um povo que continua a transmitir os seus valores de geração em geração.